sábado, 27 de outubro de 2007

Capa Mariclaire Dezembro 2005 Gloria Pires














































GLÓRIA PIRES
Momentos de GlóriaDentro ou fora dos estúdios, a vida da atriz Glória Pires seguiu um enredo surpreendente, que se confunde com a própria história da TV brasileira. Por Iara Bidermann Foto: Fernando Louza
O que acontecia nos bastidores da vida de Glória Maria Claudia Pires de Morais enquanto ela interpretava personagens memoráveis, como a vilã Maria de Fátima Acioly, de "Vale Tudo", ou a babá Nice, de "Anjo Mau"? Os episódios que marcaram a vida real dessa que é uma das mais carismáticas atrizes brasileiras formam um repertório emocional que deve, mais uma vez, ajudá-la a interpretar com maestria seu atual papel, o da empresária Júlia, em "Belíssima". Aos 42 anos, mãe de quatro filhos, três da união com o músico Orlando Morais, Glória guarda lembranças de amigos, cicatrizes e cenas que passam cristalinas nos seus grandes olhos, e provocam lágrimas -de verdade.
DE VOLTA PARA CASA"Tive oportunidade de passar três anos longe de televisão, em um momento de recolhimento total e aprendizado espiritual. Mudar de Goiânia e vir para o Rio foi difícil. A gente planejava voltar só no meio deste ano, por causa da nova novela, mas foi tudo diferente do planejado. Em dezembro de 2004, viemos para o Rio, com a idéia de passar as festas, gravar o especial de 40 anos da Globo e voltar. Mas, na semana seguinte, meu pai foi internado no hospital, de onde não saiu mais [ele morreu em 28 de fevereiro de 2005, por complicações causadas pelo Mal de Parkinson]. Logo depois, surgiu a oportunidade de fazer o filme 'Se Eu Fosse Você', de Daniel Filho, e daí foi uma loucura: fiz minha mudança para o Rio, a transferência de escola das minhas filhas, tudo por telefone. Minha volta ao trabalho coincidiu com a chegada do meu filho Bento. Ele foi muito esperado, o Orlando passou tanto tempo sonhando com esse filho. É difícil falar sobre isso, sempre me dá uma vontade de chorar. Eu tinha perdido dois bebês antes, foi uma luta. A primeira batalha foi a gente aceitar o nosso fracasso, ser humilde e se perdoar. A prática espiritual me ajudou. Como precisei encarar os meus defeitos, tive de tomar conhecimento do meu tamanho. Isso me deu um olhar mais benevolente para com o meu próximo. Também vivo um momento especial porque vejo minha filha Cleo se transformar numa mulher segura. Além do sucesso, de ela ser linda, de todo mundo estar encantado com ela. É bom vê-la construir sua vida da forma que quer. Claro que a gente está sempre junto, apoiando, para o que der e vier, mas ela ser independente é muito bacana, dá muito orgulho."
PRIMEIROS PASSOS "Meu primeiro papel principal em novela foi a Zuca, de 'Cabocla' [1979]. O diretor era o Herval Rossano, por quem eu tenho muito carinho. Eu estava com 16 anos. Ele me ensinou muita coisa, até sobre o tipo de roupa que não deveria usar. Ele falava: 'Olha, não vista isso não porque te engorda'. Como eu sou muito obstinada, ele viu que eu era um terreno onde ele podia jogar, que ia brotar. Foi uma novela que deu muito certo, o Fábio [Jr.] era o galã da hora. Comecei a namorar com ele nessa novela. Mas o nosso relacionamento sempre foi conturbado. Passamos um ano de felicidade, o ano de 'Cabocla'. Só esse foi bom. Depois, foi ficando cada vez mais difícil. Mas, no final, deu dois bons frutos: a Cleo e a novela."
VILÃ INESQUECÍVEL "A Maria de Fátima, de 'Vale Tudo' [1988], foi uma personagem maravilhosa. As vilãs são melhores de fazer porque elas não têm uma conduta moral para cercear o comportamento delas. É muito mais interessante como atriz, você se diverte muito mais, faz coisas do arco da velha. O que eu mais gostava da Maria de Fátima é que ela não era uma vilã patológica ou maniqueísta, ela tinha o lado humano, todo errado mas tinha. Na minha vida pessoal, esse momento foi uma história ainda mais especial, porque foi quando me casei com o Orlando. Superespecial. Além de tudo, a novela me deu credibilidade, as pessoas começaram a me ver de forma diferente. Foi um marco na minha carreira."
PADECENDO NO PARAÍSO "Para fazer 'Mulheres de Areia' [1993] me preparei bastante. Foram momentos espetaculares, mas como foi trabalhoso, Nossa Senhora! A Antonia tinha quase quatro meses quando eu comecei a gravar, mas ela mamou até os sete meses. Foi uma condição que pedi, disse que estava louca para fazer a novela, mas eu queria amamentar. A Antonia ia comigo para o Projac, para a praia, para todo lugar. Era uma pauleira: domingo era quando a gente viajava para Tarituba, a praia onde foi gravada a novela. Não tinha folga. Foi uma tourada, mas maravilhoso -que novela boa, né? Boa de assistir e boa de fazer, dentro dessa loucura toda."
SONHO SEM FRESCURA"Quando terminou a pauleira de 'Mulheres de Areia', o [diretor Carlos] Manga me deu o livro da Rachel de Queiroz, 'Memorial de Maria Moura', e eu fiquei apaixonada. Ele falou: 'Quero que você faça a minissérie, só pode ser você'. Eu disse que estava pronta. O Orlando me deu a maior força, disse que ficaria com as crianças. Eu tive de fazer uma preparação enorme, aprender a andar a cavalo, manejar armas, uma série de coisas. Era uma superprodução [1994], eu longe de casa muito tempo, com filho pequeno. Mas foi um presentão. Minha infância foi muito gostosa, mas sempre em cidade. Eu não tive aquela coisa de ir para o campo. Eu tinha muito medo de tudo, até de insetos, de bichos. Venci muitos medos, como o de andar a cavalo. Fiz um curso muito legal de noções básicas de sobrevivência em lugares inóspitos. Ia para a floresta da Tijuca, fazia trekking, atravessava em cima de árvores, rios, aprendia táticas para não me machucar, saber me defender. Não me lembro de outra preparação tão trabalhosa. Hoje, gosto bastante de andar a cavalo, às vezes até sonho que estou cavalgando, é uma sensação deliciosa."
NOVELA NA VIDA REAL"Interpretei a babá Nice, da novela 'Anjo Mau' [1997], que tratava do tema da empregada que se apaixona pelo patrão e faz tudo para ficar com ele. Foi um momento ótimo de trabalho. Mas, logo depois, teve aquele boato todo [uma acusação falsa de que Orlando e Cleo viveriam um romance], foi um caos. Foi pior que o furacão Katrina, um verdadeiro tsunami. A nossa sorte foi que tudo isso era uma coisa externa, a gente teve de lutar só contra o que estava fora, não havia nada estranho dentro da nossa casa. Isso nos uniu mais ainda. A pessoa que lançou esse boato fracassou totalmente no seu intuito de destruir a nossa felicidade. Aos olhos do público, era um novelão. Para nós, foram cem anos em um. Fomos embora [para Los Angeles] para a gente preservar a Antonia, que tinha só 5 anos, nós mesmos e a Cleo. Não havia lugar nenhum que a Cleo fosse sem ser apontada, na escola era um inferno, no engarrafamento também. Para o Orlando e para mim estava insustentável. Então foi ótimo ter ido. Ficamos um ano lá -eu fiquei menos, tive de voltar para fazer novela. Foi bárbaro. O Orlando fez dois clipes, conhecemos gente da indústria de entretenimento, gente que faz música, dirige, atua, escreve. Isso abriu muito os nossos horizontes e, hoje, temos contatos muito legais lá fora."

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